quarta-feira, 3 de junho de 2009

Pensando na proposta "Casamento para todos"

Em traços simples, por que é de matéria clara que falamos, não existe a opção do casamento civil para todos. As pessoas vetadas nesta matéria são obviamente os LBGT. E se o motivo da luta é esse, o fim é a igualdade de direitos.

O floreado da questão emerge das inconformidades existentes entre documentos legisladores do governo do País, como é caso da própria Constituição da República Portuguesa (CRP) cujos princípios vão beber à Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), com a lei vigente. Para além destas questões de ordem executiva e ética, levantam-se outras encetadas pelos conceitos da sociedade contemporânea portuguesa sobre este domínio e os aspectos que encerra, tal como, os efeitos multidimensionais do matrimónio para o casal.

Apesar de contemplar a escolha dos seguintes artigos da CRP como uma condicionante à leitura, pois são fruto da subjectividade da minha leitura, saliento a tentativa de realizar uma selecção criteriosa e que é uma possibilidade/ direito que vos assisti ler a totalidade do documento (os utilizados encontram-se ao longo das primeiras catorze páginas).

Pode-se então ler nos Princípios Fundamentais, Artigo. 9º, nos termos das Tarefas fundamentais do Estado:

b) Garantir os direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos princípios do Estado de direito democrático;

d) Promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais;

Pouco mais adiante, na Primeira Parte do documento, intitulada Direitos e Deveres Fundamentais, podemos destacar vários artigos:

Artigo. 12º (Princípios Universais):

1. Todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição.

Artigo. 16º (Âmbito e sentido dos direitos fundamentais)

2. Os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Artigo. 26º (Outros direitos pessoais)

1. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação.

Artigo. 36º (Família, casamento e filiação)

1. Todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade.

E por fim, Artigo. 41º (Liberdade de consciência, de religião e de culto):

2. Ninguém pode ser perseguido, privado de direitos ou isento de obrigações ou deveres cívicos por causa das suas convicções ou prática religiosa.

Aproveito para apensar de imediato o ponto que destaco do Artigo. 16º da DUDH no âmbito desta discussão:

3. A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à protecção desta e do Estado.

Se todos têm direito de gozar dos seus direitos, sendo o relativo ao casamento explícito que todos têm o direito de casar, sem especificar claramente o modelo de património pensado, por que motivo não existe essa opção? Não existe porque se diz noutro lado que duas pessoas do mesmo sexo não se podem casar. Não podem porque aborreceria, não podem porque à luz duma maioria abstracta seria incompreensível, chocaria. A inexistência da escolha peca com o valor universal de autonomia que atesta liberdade à escolha de pensar e agir responsavelmente segundo as nossas normas internas.

A responsabilidade está neste eixo para o respeito, como este último está para a tolerância e ambos estão para a liberdade de nos deixarem ser quem somos e deixarmos os outros ser quem são. A tolerância leva-nos a admitir no outro uma maneira de pensar ou de agir diferente daquela que pessoalmente se adopta, tolerar aproxima-nos apenas do deixa andar. Pondo o dedo na ferida, é homofobia. E sobre isso é preciso relativizar.

Somos todas pessoas, iguais nas necessidades fisiológicas e psicológicas humanas básicas. Todos carecemos das necessidades de prazer e liberdade, apenas para nomear duas. Existem mais, tal como nos é a todos vital a vivência plena e feliz da nossa sexualidade. No entanto, não nos resumimos a isso. Pensamos e sentimentos, por vezes num continuum emaranhado em si mesmo, para o qual princípios, valores e crenças dão sempre o seu cheirinho. E esses não resultam de geração espontânea, formam-se e desenvolvem-se à luz do contexto social e cultural aonde crescemos e da crítica que dele fazemos. Estará então Portugal preparado para esta mudança? Específico, estará a cultura portuguesa preparada para que pessoas do mesmo sexo contraiam matrimónio? De que se tratam hoje os conceitos de casal, casamento, amor e normalidade? Já não tínhamos chegado à conclusão de que a normalidade é relativa? Faz parte do paradigma humanístico do século XXI! Todavia, quanto à normalidade ainda impera o critério estatístico normativo baseado na frequência do que mais abunda é certo e ainda, no nosso caso particular, o ideológico cristão. Tratar-se-á a permissão do casamento civil a todos de um atentado às convicções religiosas dos demais religiosos? Ninguém lhes pode reprimir o direito à sua fé e se virmos isto nesta óptica seria igualmente legitimo pensarmos o contrário: se nos colocarmos na posição dos homossexuais, que ninguém sabe quantos são pois não existem inquéritos nem percentagens (confirmei no INE), é lhes negado algo porque alguém acredita, porque outro alguém disse, que era pecado duas pessoas do mesmo sexo se amarem. Ninguém pede submissão, pede-se sim e com razão tolerância e respeito. Quanto a compreensão só será possível àqueles que tiverem a abertura e o desejo de conhecer o que é realmente ser-se homossexual. Uma pessoa igual a todas as outras, apenas com outra orientação sexual.

A inexistência da opção é inequivocamente uma discriminação devido a uma convicção, no sentido que esta é uma certeza obtida por factos ou razões que não deixam dúvida. Ser-se homossexual não é, com certeza, um devaneio. E quem deseja o casamento é porque vê nele algo. Esta impossibilidade da realização individual dos LBGT nega-lhes o bem-estar que o casamento já proporciona aos heterossexuais, deixando-os aquém no domínio da igualdade real entre portugueses ao dizeres-lhes que não podem ser uma família. Esta perpetuação é ao fim ao cabo um entrave à modernização das estruturas económicas e sociais.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Em elaboração

Encontro-me presentemente a redigir o 1º texto deste blog.